quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

Conto Infantil

Há uns meses, um dedo anelar de uma mão direita que nunca teve anel entrou em depressão profunda. Todos os seus amigos serviam para algo especial, menos ele. O polegar, sozinho, serve para pedir boleia e indicar que tudo está bem; o indicador indica, apontando, e é usado para quase tudo, desde remover catotas do nariz a espremer borbulhas (aqui, com ajuda do outro da mão esquerda), passando mesmo pelo esmagar de piolhos e certas cenas sexuais (de que aqui não vamos falar). O seu amigo maior, serve, essencialmente, para insultar, e faz isso muito bem. Até o pequenote, o mindinho, serve para remexer nos ouvidos, e mesmo no nariz. E isto, sozinhos, porque em conjunto, conseguem tudo. Mas o anelar, sem anel, não faz nada de nada. A maior parte das pessoas nem o usam para escrever no teclado do computador. “Para que sirvo eu, então? Snif snif!!!” Os amigos explicam-lhe, vezes sem conta, que unidos fazem de tudo, e que precisam dele para isso, e além do mais é uma honra ser escolhido, em exclusivo, para receber os anéis; mas de nada serve, a depressão é tanta que um destes dias se recusou a sair de uma luva, dobrando-se, agarrando-se com toda a sua força, tentando sufocar-se. Foi necessário cortar a luva. Já tentou várias vezes meter-se debaixo de facas, na cozinha; cortar-se com o corta-unhas e lâminas de barbear; afogar-se no banho; queimar-se nos fósforos e cigarros. Os amigos é que o salvaram sempre, pensando que um dia seria de vez, mas não esperando, nunca, o final que veio a ter… Há 5 semanas, quando a sua unha começou a ser pintada - juntamente com as dos seus amigos -, para participar em espectáculos de travestis, nas noites de quarta-feira, os seus dias melhoraram muito, ao contrário dos dias dos seus amigos, que detestavam essas paneleirices. Um dia, decidiu mesmo assumir, aos 4 amigos, que sentia que o seu caminho passava por ali. O mundo do espectáculo seria o seu mundo, e lutaria por isso. Estava cheio de esperança numa vida melhor, teria uma vida de sorrisos e gargalhadas. No dia seguinte, em tribunal, frente a uma juíza, foi cortado por uma faca, pelo próprio corpo de que fazia parte, como forma de protesto por discordância com a sentença. Os seus amigos não o irão esquecer.

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